Fisioterapia para Fasciíte Plantar - o que realmente funciona?

 

 

A grande questão, especialmente para todos aqueles que sofrem de fasciíte plantar, é o que fazer para tratá-la? O que realmente funciona? Diversos tratamentos já foram propostos na literatura científica, muitos colocados apenas como opiniões dos experts sendo que nem todos passaram por investigações rigorosas para ver se realmente promoviam a melhora ou não. O objetivo desse texto é fazer uma revisão da literatura do que existe de tratamentos fisioterapêuticos para a fasciíte plantar, relatando os resultados obtidos para que se tenha um pouco mais de clareza em relação à comprovação da eficácia dos diversos métodos de tratamento e, assim, se façam escolhas mais sábias na hora de se escolher a conduta.

 

 

 

Tratamento Fisioterapêutico

Vamos ver que as duas formas de Tratamento Fisioterapêutico que apresentam evidências mais sólidas para aplicação nos casos de fasciíte plantar são os alongamentos específicos da fáscia plantar e a aplicação de taping. É importante mencionar que certas condutas do fisioterapeuta que podem ser úteis sequer foram pesquisadas, como, por exemplo, o uso de exercícios de fortalecimento para a musculatura do pé ou aplicação de gelo.

 

É importante ressaltar que, por mais que certas condutas estejam colocadas como mais eficazes ou apropriadas, em última instância quem decide se a conduta é apropriada ou adequada para cada paciente é o fisioterapeuta responsável. Outro ponto fundamental é que certas condutas do fisioterapeuta que podem ser úteis sequer foram pesquisadas, como, por exemplo, o uso de exercícios de fortalecimento para a musculatura do pé ou aplicação de gelo, quanto mais a combinação com o uso dessas condutas, como fortalecimento dos músculos do pé (que não foi investigado) com o alongamento da fáscia, por exemplo. Destacando, existem outras possíveis condutas que podem ser úteis ao fisioterapeuta no tratamento da fasciíte que não foram investigadas cientificamente.

 

 

 

Alongamentos

Alguns dos alongamentos mais comumente recomendados para os tratamentos da fasciíte plantar são alongamentos da panturrilha, especialmente o de “empurrar a parede”. Procurando verificar a eficácia desse tipo de alongamento RADFORD ET al (2007) o compararam com placebo não encontrando melhora significativa entre os grupos, sugerindo que o uso deste tipo de alongamento parece não ser recomendado.

 

DIGIOVANNI et al (2003) fizeram um estudo onde, basicamente, compararam a eficácia do alongamento específico da fáscia plantar com o alongamento da panturrilha no tratamento de indivíduos com fasciíte plantar crônica. Os resultados obtidos mostraram que o alongamento específico foi superior ao alongamento da panturrilha. Num estudo subsequente, DIGIOVANNI et al (2006) seguiram acompanhando os pacientes tratados, porém, aplicaram o alongamento específico da fáscia nos pacientes que haviam realizado o alongamento da panturrilha. O resultado foi a contínua melhora de ambos os grupos, ou seja, aqueles que antes realizavam o alongamento da panturrilha melhoraram significativamente ao mudarem o tratamento para o alongamento da fáscia.

 

ROMPE et al (2010) compararam os resultados do tratamento com alongamento da fáscia com a aplicação de Ondas de Choque Extracóporeas, obtendo uma melhora mais importante com a utilização do alongamento. Diferentemente do estudo de DIGIOVANNI et al (2003),nessa pesquisa os pacientes tinham fasciíte plantar a, no máximo, 6 semanas.

 

O uso do alongamento específico da fáscia plantar tem sido, de acordo com as pesquisas, uma medida eficaz tanto em situações crônicas como recentes. Além disso, sua aplicação é simples e com baixíssimo custo. Sua utilização parece ser garantida na maioria, senão em todos, dos casos de fasciíte plantar. O uso dos alongamentos de panturrilha, por outro lado, parece ser questionável e uma medida que, de acordo com o profissional, pode ser descartada da conduta.

 

 

 

Como fazer o Alongamento Específico da Fáscia Plantar?

 

Para fazer o alongamento, sente-se numa cadeira com a perna do lado da lesão cruzada sobre a outra, e posicione o pé em dorsiflexão (dobrado para cima) (fig.1). Com a mão, envolva os dedos do pé, especialmente o dedão (fig.2). Puxe então o dedão para trás, como se fosse trazê-lo em direção à região da frente da perna (fig.3). Mantenha o alongamento por, no mínimo, 10 segundos, e realize um total de 10 séries.

 

fig.1

 

fig.2

 

fig.3

 

Você pode ver que a fáscia plantar fica tensionada, e pode perceber isso com os dedos (fig.4).

 

fig.4

 

Deve-se realizar uma série de 10 repetições do alongamento logo antes de apoiar o pé no solo, após acordar.   Esse procedimento deve ser repetido ao menos outras 2 vezes durante o dia. Os resultados, geralmente, podem ser sentidos em pouco tempo.

 

Referências Bibliográficas:

DiGiovanni et al - Tissue-specific plantar-fascia stretching exercise enhances outcomes in patients with chronic heel pain – a prospective, randomized study – The journal of joint and bone surgery – v.85-A, n.7, 2003.

 

DiGiovanni et al – Plantar fascia – specific stretching exercise improves outcomes in patients with chronic plantar fasciitis – a prospective clinical trial with two-ear follow-up – The journal of joint and bone surgery – v.88-A, n.8, 2006.

 

 

 

 

 

 

Terapia Manual

As técnicas manuais (articulares especialmente) da Fisioterapia foram aplicadas, com adequação individual, no estudo de CLELAND ET al (2009) e comparadas com a aplicação de Ultra-Som e Iontoforese, sendo que ambos os grupos também realizaram exercícios. O grupo que recebeu aplicação das técnicas obteve melhora significativamente maior que o grupo do Ultra-Som, tanto em relação à dor quanto em relação à função, isso ao fim do tratamento (4 semanas) e 6 meses após o início do tratamento. 

 

RENAN-ORDINE ET al (2011) avaliaram, através de um ensaio clínico randomizado com 60 pacientes, o benefício adicional da Terapia de Trigger Points, realizada na musculatura da panturrilha, à aplicação do Alongamento da Fáscia Plantar. Os indivíduos foram aleatoriamente divididos num grupo que realizou o alongamento e outro que, além do alongamento, recebeu tratamento por Terapia de Trigger Points. Observaram que o grupo que recebeu a terapia adicional obteve maiores benefícios tanto em dor quanto em função. 

 

As técnicas de Liberação Miofascial aparentam também trazer benefícios no tratamento da fasciíte plantar. AJIMSHA ET al (2014) estudaram 60 pacientes, dividindo os em um grupo que recebeu Liberação Miofascial e outro que recebeu tratamento placebo, sendo que os resultados mostraram uma melhoria da função significativamente maior no grupo que realizou tratamento.

 

 

 

Taping

O uso de fitas adesivas que visam limitar o movimento de segmentos do pé ou tornozelo, dessa forma minimizando a sobrecarga na fáscia plantar e conseguindo a melhora dos sintomas, é outra estratégia de tratamento frequentemente usada por fisioterapeutas.

 

HYLAND et al (2006) compararam o uso de taping do calcanhar com o alongamento da fáscia e tratamento placebo. Como resultado, embora tanto o uso do taping quanto o alongamento tenham sido claramente mais eficazes que o placebo, o uso do taping foi significativamente melhor que o alongamento da fáscia. LANDORF et al (2005) compararam a aplicação de taping Low-Dye com um grupo que não recebeu tratamento, obtendo melhora com o taping. RADFORD et al (2006) obtiveram leve melhora na primeira semana de tratamento com a aplicação de taping Low-Dye em relação ao placebo. ABD EL SALAM & ABD ELHAFZ(2011) compararam dois tipos de taping, o Low-Dye e o taping de suporte do arco medial no tratamento de indivíduos com fasciíte, obtendo um maior nível de melhora naqueles em que foi aplicado o taping de suporte do arco medial.

 

O taping parece ser uma medida eficaz de tratamento. Porém, existem diferentes formas de aplicação de taping, cujo efeito resposta e terapêutica variam. O taping do calcanhar, o Low-Dye e o taping de suporte de arco medial parecem ser úteis na melhoria dos sintomas da fasciíte e assim um recurso útil para os fisioterapeutas.

 

 

 

Palmilhas

WALTHER ET al (2013) avaliaram diferentes tipos de palmilhas pré-fabricadas na sintomatologia da fasciíte plantar, observando que a palmilha de plástico rígida coberta de espuma produziu melhores resultados que a palmilha leve de espuma, sendo que a palmilha fina sem suporte não produziu qualquer benefício significativo. BALDASSIN ET al (2009) avaliaram palmilhas de EVA customizadas e pré-fabricadas, observando que ambas produziram bons resultados em indivíduos com fasciíte (infelizmente não utilizaram também um grupo placebo para confirmação). RING & OFFER (2013) encontraram (bons) resultados semelhantes entre palmilhas individualizadas e pré-fabricadas, ressaltando que as pré-fabricadas são mais baratas. LANDORF ET al (2006), por outro lado, não encontraram efeitos significativos do uso de palmilhas pré-fabricadas ou customizadas, relatando que elas produziram apenas uma pequena melhoria na função e diminuição da dor. GROSS ET al (2002) observaram que palmilhas customizadas semi-rígidas melhoraram a dor de indivíduos com fasciíte (também não utilizaram um grupo placebo). ROOS ET al (2006) compararam órteses noturnas com palmilhas obtendo resultados semelhantes para ambos. UDEN ET al (2011) compararam o uso de palmilhas com o de corticoesteróides, ressaltando que embora ambas possam produzir melhoras da dor, o uso de palmilhas não tem efeitos colaterais. FONG ET al (2012) obtiveram melhores resultados combinando-se o uso de calçados de sola espessa (“rocker shoes”) com palmilhas customizadas do que com o uso isolado de qualquer uma delas. LEE e al (2009) realizaram uma meta-análise concluindo que o uso de palmilha parece promover melhora da dor e da função.

 

 

 

O uso de palmilhas parece produzir resultados em pacientes com fasciíte, embora ainda não haja clareza para se definir o tipo de palmilha e o grau de customização necessários para seu uso adequado.

 

 

 

Acupuntura

ZHANG et al (2011) compararam a aplicação de acupuntura em dois pontos diferentes do pé de pacientes com fasciíte, encontrando uma melhora significativa num deles apenas. KARAGOUNIS ET al (2012) utilizaram a acupuntura associada a outras terapias em um grupo de atletas recreacionais, comparando os resultados com um grupo que realizou as mesmas terapias sem acupuntura. Os primeiros obtiveram um grau de melhora maior, porém pequeno, em relação ao grupo sem acupuntura mas, apesar disso, os autores concluíram que ela pode ser útil combinada com outros métodos de tratamento. KUMNERDDEE ET al (2012) compararam a aplicação de eletroacupuntura associada ao ‘tratamento convencional” (alongamento, modificação do calçado e analgésicos) com “tratamento convencional” apenas, obtendo uma evidente melhora com o uso da acupuntura. CLARK & TIGHE (2012) fizeram uma revisão da eficácia da acupuntura para fasciíte plantar concluindo que as evidências existem para sua eficácia.

 

 

 

Infravermelho

A aplicação de Luz Infravermelha e consequente efeito foto-térmico foi alvo da pesquisa de REEBOONLAP ET al (2012). Compararam dois grupos, um recebendo tratamento com anti-inflamatórios e alongamento da panturrilha e o outro tendo adicionado a aplicação de Luz Infravermelha. Os resultados indicaram que o grupo com aplicação de Luz Infravermelha obteve uma melhoria maior do que o grupo que não a recebeu.

 

 

 

Iontoforese

OSBORNE & ALLISON (2006) relatam que o uso da Iontoforese em combinação com taping produziu melhores resultados que a o tratamento com placebo associado ao taping.

 

Tanto a Acupuntura, o Infravermelho e a Iontoforese necessitam de mais pesquisas, embora os artigos encontrados até agora tenham demonstrado bons resultados.

 

 

 

Laser

KIRITSI et al (2010) compararam a aplicação de laser para tratamento da fasciíte em relação ao tratamento placebo, avaliando não somente a alteração dos sintomas, mas também a alteração da espessura da fáscia com o uso de Ultrassonografia. Observaram que o laser não somente foi eficaz no tratamento, produzindo melhoria dos sintomas, como também produziu uma diminuição da espessura da fáscia plantar no grupo tratado em relação ao grupo controle. BASFORD ET al (1998) também usaram o laser em seu estudo, embora de um tipo diferente, não encontrando benefícios no seu uso para o tratamento da fasciíte.

 

Considerando-se que a forma de aplicação do laser pode ser um fator decisivo na obtenção de resultados, não é surpresa que dois estudos tenham obtidos respostas diferentes. Ainda não é evidente sua eficácia no tratamento da fasciíte plantar, de forma que cabe a cada profissional a decisão sobre sua utilização e sobre os parâmetros de aplicação.

 

 

 

Ultra-Som Terapêutico

CRAWFORD & SNAITH (1996) aplicaram Ultra-som contínuo de 0,5W/cm2, 3MHz para o tratamento de pacientes com fasciíte não obtendo melhoras em comparação com um grupo placebo. ZANON ET al (2006) aplicaram Ultra-Som com uma intensidade maior também não obtendo melhoras significativas em relação a um grupo que não o recebeu.

 

 

 

Eletroestimulação

Não foram observados benefícios da eletroestimulação no tratamento da fasciíte plantar quando associada a u tratamento com uso de órteses e alongamento de acordo com STRATTON ET al (2009).

 

Não há relato de benefícios com a utilização do Ultra-Som ou da Eletroestimulação, de forma que sua utilização parece ser desnecessária. Porém, similarmente ao laser, a forma de aplicação desses métodos pode ser decisiva na obtenção de resultados clínicos de forma que, em última instância, cabe a cada profissional decidir a respeito de seu uso ou não.

 

 

 

Conclusão

A maior parte das possíveis condutas fisioterapêuticas não possui um número suficiente de pesquisas para serem classificadas como condutas realmente importantes. De fato, algumas condutas como o uso de exercícios de fortalecimento para os músculos do pé sequer foram investigadas. Ainda assim, é possível dizer que o uso do Alongamento Específico da Fáscia Plantar e o uso de Taping são condutas que aparentam ter um importante grau de eficácia a um baixíssimo custo de aplicação e que, portanto, devem ser considerados como conduta na maior parte, senão na totalidade, dos casos de fasciíte plantar. A Terapia Manual é outro recurso que parece ser bastante útil. 

 

O uso de palmilhas também parece ser útil, mas regras claras a respeito do tipo de palmilha e necessidade de customização não estão claros. Acupuntura é outra conduta que parece promover benefícios aos pacientes com fasciíte.  Condutas como Iontoforese, Infravermelho e Laser também podem ser consideradas. Ultra-Som Terapêutico e Eletroestimulação não parecem fornecer bons resultados porém não podem ser totalmente descartados devido a grande variedade de parâmetros que podem ser utilizados.

 

 

 

 

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